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[Papo Zen] ☀️ Como a positividade tóxica está te impedindo de ser feliz
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[Papo Zen] ☀️ Como a positividade tóxica está te impedindo de ser feliz

Se comprometer com a sua própria felicidade é o maior ato de autoamor e escolher a felicidade não vai te transformar na Pollyanna

Eu estou aqui na casa dos meus pais e eu me deparei com o livro que me acompanhou durante toda a minha adolescência, já que era o único que eu tinha para ler: Pollyanna, da Eleanor H. Porter. Eu reli ele todos os anos, dos 12 até o início da minha fase de jovem adulta.

Ele conta a história de uma menina pobre, a Pollyanna, que é ensinada pelo pai o “Jogo do Contente”, ver o lado bom das coisas. Ela é muito alegre - toxicamente alegre -, e ao se tornar órfã, vai morar com a tia rica.

Na página 31, a Pollyanna explica para outra personagem o que é esse jogo: “encontrar em tudo, qualquer coisa para ficar alegre, seja lá o que for”.

Acompanhamos na leitura como todo esse contentamento forçado desencadeia situações na vida de Pollyanna que poderiam ser evitadas se ela soubesse como encontrar beleza nas coisas como elas são ao invés de tentar transformar tudo em um motivo para sorrir, até os momentos mais difíceis que uma criança pode atravessar. Ela tinha só 12 anos também.

Desde a primeira vez que eu li o livro, eu entendi que o jogo do contente não era assim tão positivo, mas mesmo assim eu joguei ano após ano, quando eu não encontrava outra saída para as cavernas sombrias que eu estava atravessando. Mas quando a gente chega a um extremo, nossa atitude natural é buscar o extremo oposto. Da positividade tóxica, saltei para o pessimismo. “Se der certo, é lucro, se der errado, eu já esperava por isso mesmo”, imagina viver esperando pelo pior.

Encontrar beleza nas coisas como elas são é uma filosofia japonesa chamada “wabisabi”. É sobre aceitar que as coisas mudam e que elas são imperfeitas. Nós. Os objetos ao nosso redor. Nossas relações. Não é nem se agarrar a positividade tóxica de que “tudo vai ficar bem”, nem se escorar na negatividade de “as coisas estão programadas para darem errado e só existe o mal nesse mundo”.

Wabisabi seria receber muletas quando se tem 12 anos de idade ao invés de bonecas e ao invés de ficar contente com isso, ou entrar em um ciclo de negativa, entender que isso é passageiro e que a vida não é perfeita.

Encontrar beleza nas coisas como elas são é ser honesta consigo mesma, sem ignorar as partes que doem.

Só que, enquanto a alegria, o contentamento, é uma emoção, uma reação do cérebro, a felicidade é um sentimento que pode ser criado - e não necessariamente da alegria. Um dos nossos hormônios do bem-estar, é a dopamina. Ela pode ser liberada de diferentes formas: comendo um chocolate, ouvindo música, praticando atividade física e até mesmo pensando positivo.

Onde está a alegria em levantar 17kg no supino? Em mim com certeza não está. O que me deixa alegre mesmo é assistir “Esposa de Mentirinha” pela milésima vez numa sexta-feira depois de estourar uma pipoca de micro-ondas.

Já a felicidade é um estado de espírito que eu consigo construir e me comprometer com ele. É um estado de consciência. Satisfação. Bem-estar. Nós somos feitas de energia e estamos vibrando o tempo todo, entrando em atrito com a energia de tudo ao nosso redor.

Quando pensamos positivo, nossa energia vai lá em cima e inunda o lugar. E o contrário também acontece. Eu tenho certeza que você já sentiu a energia de um lugar murchar de alguém entrar. E às vezes esse vampiro pode ser a gente mesma. Acolher sem julgar. Nosso mantra.

Só que hoje, nossa dopamina está viciada pelos disparos baratos das redes sociais e das notificações. Temos picos de felicidade que se esvaziam na mesma velocidade em que parecem nos preencher completamente. Então, hoje, mais do que nunca, precisamos escolher com cuidado o que vai alimentar esse hormônio e transformar isso em uma rotina de autocuidado consciente.

Só que sabe qual é a melhor parte disso tudo. Essa felicidade também vai passar. Que graça teria a felicidade se apenas ela existisse?

Dá para enxergar com nitidez a diferença entre ver beleza nas coisas como elas são e a positividade tóxica quando eu olho ao meu redor.

Muita gente se nega a reconhecer as imperfeição ficando agarradas ao “tudo na vida é um aprendizado”, sem realmente aprender nada com aquilo. Ficando presas ao “a vida é aqui é assim mesmo, mas você vai vencer”, sem se dar a chance de questionar se deveria ser assim mesmo ou se só é assim por convenção social.

São nesses momentos que a gente precisa mergulhar no significado das palavras. Aceitar as imperfeições, não é se acomodar nas rachaduras. Não é porque te dão algo que você precisa ficar com aquilo para sempre.

Aceitar não é simplesmente concordar ou aprovar aquilo como certo, dentro das coisas que você acredita. Aceitar não é se conformar. Aceitar não é só obedecer. Aceitar também é reagir. Tomar para si.

Acatar, acolher, aderir, admitir, adotar, assentir, ceder, conceder, consentir, permitir, receber, reconhecer, seguir.

Todas essas são definições do Michaelis.

Aceitar as imperfeições é respeitar aquilo que está diante de você, sem tornar aquilo em você.

É nesse momento que a gente abraça a positividade tóxica de novo.

Quando aceitar se torna se acomodar. Vamos ser sinceras? Sentar na merda é tão confortável quanto sentar no colchão mais macio das Casas Bahia. Até que a merda começa a feder.

Tem um limite até onde e quanto você pode ficar sentada na merda e é a positividade tóxica que está fazendo você ficar aí, nesse colchão que parece muito confortável, até você perceber que está sozinha porque ninguém aguenta ficar perto de algo que fede tanto.

E essa positividade tóxica pode vir de tantos lados. Da Pollyanna àquele reels que vive cruzando seu caminho no feed do Instagram.

Escolher a felicidade é sair do colchão de merda que foi se criando ao nosso redor e se comprometer a olhar para vida com maturidade.

A própria Pollyanna, em um momento no livro, não consegue mais jogar o jogo do contente e alimentar sua positividade tóxica. Ela é atropelada por um carro e não consegue mais andar.

“Como poderei ficar contente de qualquer coisa, Miss Hunt, se não posso mais andar?”, é nesse ponto da história que Pollyanna, que viveu até aquele momento no extremo positivo do espectro que é nossa vida, salta para o extremo oposto e abraça a negatividade e a menina só alcança o ponto de equilíbrio quando olha para a verdade das coisas.

Ela não fica contente por ter perdido o movimento nas pernas, ela se contenta pelas coisas que conseguiu fazer quando ainda podia andar.

Eventualmente, percebemos pequenos resquícios da positividade tóxica em Pollyanna, quando ela finalmente consegue dar seus primeiros passos depois do tratamento, mas é um fato: os hábitos ruins são os mais fáceis de se instalarem na nossa vida e os mais difíceis de mudar.

“Quem nunca perdeu as pernas não avalia o que significam pernas”, e ela fica contente por ter perdido seus movimentos por algum tempo, porque aprendeu a valorizar o que tem. Tudo isso isso alimenta esperança no seu coração.

“Esperança é a única coisa mais forte que o medo”, já diria Suzanne Collins em Jogos Vorazes.

Muitas vezes, abraçamos a positividade tóxica como se ela fosse um escudo contra o medo. Por que abrir as portas do medo quando você pode simplesmente dizer que “vai dar tudo certo”?

Lá no começo, quem abraçou a positividade tóxica foi o pai da Pollyanna, provavelmente com medo do que a filha pensaria se soubesse que ele não tinha de condições de dar uma vida cheia de luxos para ela, como ela via outras meninas.

Esse medo, poderia vir do medo de não ser respeitado por ela por não ter essas condições. Esse é mais um medo que poderia vir de outro ainda mais profundo, como não ser respeitado por outros pais, já que não tinha o respeito da própria filha.

Um medo pode ser alimentado por outro de forma infinita e todos são portas para compreendermos o que estamos carregando dentro de nós.

Muito tempo atrás, eu me peguei atrasando minha felicidade por causa do medo.

Eu tinha medo da opinião dos outros, então eu perguntei para o medo: por que? Muitas das vezes que a gente faz essa pergunta, tem um motivo muito racional por trás do medo, mas nesse caso não tinha. Meu cérebro buscou razões para justificar esse medo e simplesmente não encontrou.

O “Medo da Opinião dos Outros” exercia uma influência tão grande sobre mim que eu era incapaz de fazer qualquer coisa que envolvesse me colocar em destaque.

É verdade que as opiniões alheias poderiam me deixar insegura, fazer parecer que eu não pertenço, fazer eu me sentir inadequada, mas nenhuma dessas opiniões, que veja bem, eu não pedi, me definem como pessoa. Não definiam antes e ainda não definem, hoje, que eu aprendi a não ligar.

Muito provavelmente esse “Medo da Opinião dos Outros” vinha do meu orgulho. O medo de dar a cara a tapa e talvez e errar. E ser vista errando. Ninguém gosta disso. Só que quando você pergunta “por que?”, para esse medo, você descobre que ele vem da nossa criação como mulher. Ele vem daquele lugar onde a gente acha que só tem direito a vida, direito de ser amada, se a gente for perfeita.

A gente não quer ter que explicar para o outro o porquê do que a gente estava fazendo não deu certo, porque isso quer dizer que não somos perfeitas.

Mas lembra lá do wabisabi? Ver beleza nas coisas como elas são. Até em nós mesmas. Ainda mais um ser humano como a gente. Contraditórias, cíclicas, vivas.

É legítimo ter medo de dar satisfação para os outros sobre si mesma, porque a gente sente vergonha, principalmente quando está começando algo novo. A gente não gosta do desconforto de não saber. Mas não conseguir sustentar o desconforto de não ser perfeita não deve controlar a nossa vida.

Você ainda existe, mesmo se estiver errada. Se permita errar. Você não é nem precisa ser perfeita. Começa a vidar a página. Combinado?

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